sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

A VIOLÊNCIA COMEÇA MUITO ANTES DOS ESTÁDIOS



Insisto na tese de que problemas complexos não podem ser resolvidos com soluções simplistas e isoladas. Assim, claro que é bem-vindo o programa das várias bolsas criadas pelo Governo Federal, por exemplo, as quotas para os afro-descendentes nas universidades, mas não podem ser medidas isoladas e pronto. Assim, elas não passam de ações assistencialistas, uma forma de varrer o lixo para debaixo do tapete. Uma bela maneira de se evitar as mudanças necessárias que envolvem uma profunda rearticulação da economia, nova distribuição de renda e medidas profundas no redirecionamento do ensino em todos os níveis para que não se resolva o problema, apenas no gargalo de saída, o que, em última análise, não passa de uma grande mentira e mais um - entre muitos - processo de enganação das pessoas.

Assim também é o tão debatido problema da violência nos estádios, os conflitos entre torcidas, os crimes, espancamentos, mortes e violência que vêm aumentando em taxas alarmantes nos últimos tempos. A violência nos estádios não é gratuita. Ela é o fruto da reunião de pessoas que estão desempregadas, com dívidas, com o nome sujo no mercado, sem dinheiro para o aluguél, a alimentação, os remédios. Ou por riquinhos, autênticos filhinhos de papai, a quem faltam valores, sensibilidade, compaixão, empatia. Pessoas compradas, sem amor, cheias de cinismo e de maldade.

A violência acontece porque falta às pessoas que ali se aglomeram, de uma maneira geral, educação, sensibilidade, cultura, valores. Isto associado aos problemas pessoais que acumulam, as dificuldades que as perseguem no dia a dia, como a falta de emprego, de dignidade. O transporte urbano precário, as filas, o calor insuportável, as desavenças nas famílias; claro, tudo isto eclode frente a aula de competição e violência que o próprio esporte representa.

Muito me estranha porque os psicólogos não colocam a boca no trombone neste sentido. São medrosos ou cegos? Temos que pensar seriamente neste sentido e tomar providências mais que urgentes para a solução desta problemática tão grave e séria a que nos achamos todos expostos direta ou indiretamente. A ânsia pessoal em ver o seu time ganhar. O vigor que surge naturalmente em função da vitória ou da derrota, a adrenalina que aflora nestas ocasiões precisa ser canalizada para o mais próximo, o que está de lado, surgindo, naturalmente, a vontade de gritar, de bater, de esmurrar que vai aumentando gradativamente à medida que tal ação é recíproca, chegando ao total descontrole em meio ao turbilhão das multidões desenfreadas das galeras dos estádios, das pistas, das quadras, enfim, do esporte competitivo, seja ele o qual for.

O futebol, por exemplo, e mais ainda, o vôleibol, embora possa não parecer são esportes altamente violentos do ponto de vista dos processos do inconsciente. Sem chutes, murros, berros e caretas eles não acontecem e não significam nada. Ficam sem graça, frios, desinteressantes. A rigidez das normas que os acercam também constitui outra realidade política, social e psicologicamente grotesca. Elas são rijas, fixas, milimétricas. Exigindo do atleta e sendo cobrada pelas torcidas uma alta performance em nível de detalhes mínimos, de toques, de formas, de contato, de relação com o outro, com o que joga, com o adversário. Aliás esta é uma palavra que por si já explica muita coisa.

A ânsia no ganhar a qualquer custo, ainda que seja nos pênaltes ou saques finais - nos casos do futebol e do vôlei - mas sem deixar claro que se há quem ganha, naturalmente tem que haver quem perde e precisará, em conseqüência, descarregar as suas mágoas, suas dores seus sentimentos de perdedor, de vencido, o que é lógico, gera mais violência, num ciclo altamente vicioso, latente, interminável.

A concepção sistêmica da ciência nos alerta que os problemas têm pelo menos quatro pontos de sustentação que precisam ser vistos se quisermos solucioná-los, e, que são: causa, efeito, processo e resultado e a especificiidade de cada situação exige que atuemos, ao mesmo tempo nestes segmentos todos, sob pena da interferência negativa constante de um no outro neutralizar as ações isoladas que são tomadas e que podem não significar nada. Pelo contrário, podem até atuar na ampliação do problema e cada um dos seus resultantes no campo macro em que necessariamente atuam.

Investir somente na polícia para resolver o problema da violência urbana é apenas uma meia verdade que camufla o problema e adia a sua exteriorização ainda mais grave a médio ou longo prazos. É só esperar para ver. A complexidade deste tipo de situação exige investimentos em qualidade de vida, distribuição de renda, orientação familiar, respeito, educação, cidadania, espiritualidade, valores, etc. o que o governo precisa ultimar providências e não justificar eternamente o não fazer, num discurso sempre bonito mas cada vez mais controverso e vazio.

Proibir as torcidas organizadas é uma piada de extremo mal-gosto. Policiar os estádios e o comportamento do torcedor é um outro crime, uma outra espécie de violência que se comete contra as pessoas. O que deve ser feito é não usar mais o esporte e as práticas físicas como subterfúgios para esconder as mazelas sociais geradas pelo Estado incompetente, inoperante e uma sociedade ingênua e acomodada. Se o torcedor tiver a barriguinha cheia, um lar aconchegante, uma cama quentinha para repousar depois da explosão do jogo. Educação, dignidade, emprego, cidadania, valores, sensibilidade, nada disso acontece.

Estamos historicamente atrasados de séculos. Já passa muito da hora de vivermos esta nova realidade, ainda que experimentalmente, não só nos estádios mas na vida. É preciso que distribuirmos o prazer de ser e de estar, as condições de uma vida digna no sentido mais amplo possível. A alegria de ser gente e de ser cidadão, poder trabalhar e ajudar a construir a sociedade dos sonhos de cada um é talvez a experiência tardia que nos falta. Quem sabe possamos pensar em experimentá-la. Enquanto é tempo, pois ainda resta uma esperança esquálida, que se esvai a cada momento.
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Antonio da Costa Neto

CORA VIVE



Complexa,
maravilhosa,
mente lúcida,
Cora Coralina.
Poetisa de verdade, pois
escrevia versos e fazia doces.
A poesia que não adoça,
não melhora a vida,
a condição humana,
não pode ser digna deste nome.
São letras estéreis, vazias, mortas.
Melhor seria o papel vazio.
Possibilitando imagens, viagens...
Viva Cora.
Cora vive.
Antonio da Costa Neto

sábado, 23 de fevereiro de 2008

A MISÉRIA DO PENSAMENTO LINEAR



Em nossa cultura, acostumámo-nos demais à visão linear e imediata, à busca simplista do resultado pelo resultado das coisas. Criamos, por assim dizer, um “tapa” em nossos olhos que não nos permite enxergar dos lados, ver nuances, perceber detalhes, enfim; ter uma percepção no mínimo elástica dos elementos que compõem a nossa vida, o que constitui uma inconcebível tragédia, um atraso humano incomensurável, frente às novas exigências do mundo de hoje. É muito triste testemunhar e ter que viver este tipo de fenômeno sabendo que ele é uma tortura imensa, uma fonte inesgotável de sofrimento para a humanidade inteira.
É o chamado paradigma
cartesiano-newtoniano que se fundamenta e mantém o pensamento simplificado, linear, objetivo, inflexível, frio e absolutamente racional da maioria das pessoas, e, por conseguinte, das organizações, do governo, das famílias, da igreja, enfim, da sociedade. Porque é o pensamento que garante o produto, o lucro, o bem-estar dos comandos. Vemos sempre as coisas pelo mesmo viés com que nos foram impostas há alguns séculos, às vezes, milênios. Ou seja, pelo método, a forma que certamente irá beneficiar o branco, o macho e os detentores do capital em detrimento de todas as demais categorias de pessoas que compõem a maravilhosamente rica diversidade humana que ainda não é respeitada numa cultura como a nossa. Pelo contrário, se tentarmos defendê-la, seremos bravamente atacados pelos guardiões dos interesses contrários que são sabiamente ocultos em todas as sociedades e momentos históricos das civilizações, sendo que a absoluta maioria morre sem saber disto.
Para ser mais didático: recebi outro dia de presente, de uma amiga muito querida e especial uma coleção de pratos coloridos, pintados, verdadeiras obras de arte para a decoração das paredes da minha sala, o que, claro, deixou-me bastante feliz – já começa vir ao caso , pois o possível pensamento linear talvez ficasse mais feliz com pratos menos artísticos e que se prestassem para servir refeições, ou seja dentro do seu objetivo regular e conceitual.
Como não apresentavam um suporte, ou uma forma de prendê-los à parede tentei comprar algo para esta finalidade e não consegui. Imaginei a adaptação de alguma coisa e saí à procura de uma peça, um gancho, um pedaço de madeira, de couro, de ferro. Visitei casas de arte e artesanato, ferragistas, lojas de materiais para costuras e aviamentos, de artigos em geral, feiras, mercados populares, e nada.
O mais incrível é que, quanto mais eu tentava explicar o que e como eu queria, menos as pessoas pareciam entender. Sempre me vinham com as sugestões mais esdrúxulas e às vezes, apenas começavam a me escutar e já diziam logo que não tinha jeito, que eu fosse em outra loja, procurasse um serralheiro, etc. Houve até quem me propusesse a desistir, a esquecer os pratos na gaveta ou que passasse a utilizá-los nas refeições de domingo, já que eram tão bonitos, numa autêntica expressão de deboche.
Quase desesperado, exausto, suado da cabeça aos pés, desisti finalmente – pois sempre que queremos mudar, acabam nos vencendo pelo cansaço. Fui pra casa e com um bom pedaço de couro de um velho cinto encontrado, uma boa cola e imaginação, resolvi o problema. Hoje os pratos me enchem os olhos, embelezam minha sala, minha vida e me deixa bem mais feliz.
Mas o que me indigna é a absoluta dificuldade das pessoas de perceber o novo, o alternativo, de inventar soluções novas e criativas. Nesta minha procura vi que muitos me olhavam como louco, com um rizinho de esguelha no canto da boca que por pouco não me levou a me sentir um ridículo e perdido no meio daquela confusão armada a serviço de nada.
E num tempo em que a dinâmica do mundo exige que abandonemos a objetividade pura e simples para adotarmos uma percepção não só subjetiva, mas intersubjetiva dos fatos e fenômenos tão complexos do dia a dia, ainda persistimos numa visão cartesiana que responde como responsável por grande parte das dores e do sofrimento do ser humano no planeta.
Ainda detemos uma realidade machista, com predomínio do gênero masculino no poder, na tomada das decisões e na condução dos destinos do mundo. Até na nossa linguagem o macho domina: se nos referirmos, por exemplo a duas mulheres e a um homem, diremos gramaticalmente, eles, no masculino, o que significa poder, mando, frente, liderança.
O que realmente manda, o que conta, são os valores convencionais, a norma, a tradição, a cultura arraigada do “sempre foi assim e tem que ser assim; do aprimorar, aperfeiçoar, reciclar o que temos e não mudar, pois a mudança pode significar a perda dos privilégios historicamente acumulados por certas categorias humanas.
Por isso, ainda fazemos os concursos públicos com base nas provas objetivas e na identificação de conhecimentos enlatados em série, que se estuda para a prova e se esquece no dia seguinte, perpetuando aí um serviço público, por exemplo, exercido por pessoas ideologicamente descomprometidas com os processos e preocupadas com o tecnicismo, os relatórios, a burocracia.
Nossas escolas, do jardim da infância ao mais elevado nível acadêmico das mais importantes universidades ainda estão unicamente preocupadas em ensinar pela indução desassociada da dedução, instruindo friamente para a garantia da perpetuação do modelo cartesiano que circula viciosamente há séculos e que já deu mais do que suficientes provas da sua estrutura ultrapassada e caduca.
Precisamos suprimir a objetividade, associar os processos aos resultados, valorizar o simples, enxergar o belo, inventar formas novas de fazer as coisas. Saber buscar alternativas, valorizar as críticas e percepções do outro, do diferente, pois é daí que sairão as soluções para os graves problemas do mundo e da vida. A cura para as mais graves doenças certamente virão dos quintais, das beiras das estradas de terras, das raízes, das ervas. De conversas descompromissadas das comadres nas varandas, nos jardins, nas hortas, e de brincadeiras de crianças é que surgirão métodos e técnicas para os complexos problemas do trânsito, do aquecimento global, da poluição. De acidentes de percurso que sairão novos instrumentos para a garantia de preservação da espécie e assim por diante.
A ordem é, portanto, relaxar, valorizar o insight, o processo, o novo e deixar acontecer. Como no velho e bom princípio bíblico: “Olhai os lírios do campo e olhai as aves do céu. Eles não trabalham, não fiam e nem ceifam, porém são vestidos de um luxo maior do que a corte do mais poderoso dos reis e alimentadas todos os dias, saudável, deliciosa e fartamente . Tudo é igualmente importante, nada é mais fundamental do que qualquer coisa. E, na primavera da vida, os galhos que nascem são natural, harmônica e esteticamente, uns longos, uns curtos; uns retos, uns tortos. O universo é belo porque é rico, complexo e infinitamente diversificado. E nele, e, logicamente, nada é mais fundamental do que qualquer coisa.
Pense e pratique isso. Comece agora! Comece ontem! Pois hoje já pode ser demaiado tarde.


Antonio da Costa Neto

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008



"...Em minha vida, coloquei as descrições de pedras, paus e bolas de bilhar numa caixa...... e as deixei ali....
Na outra caixa coloquei coisas vivas: caranguejos, pessoas, problemas sobre o belo...
Qual o padrão que une o caranguejo à lagosta, a orquídia à prímola, e todos os quatro a mim?
E eu a você?"


(Gregory Bateson)

PEDRO BIAL, MEIO...



Detesto programas na linha do Big Brother Brasil que é um pleno desafio à corrupção, ao uso da ingenuidade das pessoas. Uma ode ao enriquecimento fácil e ilícito, além de ser uma lição de oportunismo, segregação, preconceito, etc. etc. etc. O BBB é uma antecipação das nossas vidas vigiadas o tempo todo. Da nossa falta de liberdade, da certeza de estarmos sendo vistos e corrompidos o tempo todo e, por isso mesmo, não podermos mais viver as nossas vidas, realizar nossos sonhos, darmos vazão às nossas fantasias, sejam elas quais forem. Afinal, conquistamos a democracia e com ela a nossa automia e o direito pessoal de sermos e vivermos o que e como quisermos sem ter que prestarmos contas a ninguém.

Mas isto é perigoso num mundo de conflitos como o nosso. É precisso acabar pouco a pouco com a liberdade das pessoas e nada como um BBB, com uma casa repleta de corpos belos, semi-nus, sensuais. Com luxo, conforto, decoração esmerada. Sexo e comida à vontade. Estoques de camisinhas divulgados amplamente para o bel-prazer daqueles que as quiserem usar e tudo mais.

Como se já não bastasse a roubalheira, agora foi inventado o "paredão triplo" que faz a alegria do Bial que aproveita para mostrar a sua bossa, sua eterna juventude, seu caldo ainda desejável do bom-moço global capaz de convencer moçoilas indefesas, pais de famílias desempregados, enfim a todos a votarem para salvar seus queridinhos. No que afinal, a Rede Globo lucra muito e pode pagar, com certeza, seu lauto salário que o bom jornalista merece ganhar.

Claro que o BBB é ótimo para quem participa. É legal estar naquela casa, mostrar a bunda, deglutir as guloseimas das festas pagas com o nosso rico dinheirinho - nosso, vírgula, porque eu nunca votei e nem votaria, nem contra o Jean que é uma pessoa que eu já conhecia e tinha bom motivos para que ele não mordesse o um milhão que acabou mordendo - menos mau. Mas é um péssimo investimento para a sociedade brasileira que parece não ter mais com o que se divertir e precisa de lançar mão deste tipo de expediente, tão baixo, tão vil.

Conheço gente que participou dos BBBs antigos e se arrependeu amargamente. Gente que tem vergonha na cara. A única pessoa que até agora participou de todas as edições foi o jornalista da Globo, Pedro Bial. Que a cada dia aparece com mais gracinhas, com mais futilidade em sua voz, mais imaturo, artificial, ridículo, com suas mentirinhas grosseiras, fazendo a cena do emocionado, do inteirado, do afim.

É uma pena que uma pessoa como ele caia nesta teia - para não perder o emprego, coitadinho. Ele ainda não descobriu que o que vale mais é a dignidade, a força do amor e da verdade de lutar pela vida, as pessoas que sofrem e não fazer caretas e garatujas para conseguir tomar o leite das criancinhas das favelas, dos morros, que se transforma em votos, que se fundem na incomensurável fortuna dos donos da Globo.

Meu sonho é por uma programação de TV sem Bi Brother. Ou melhor ainda, com uma sociedade inteira que não desse nenhum voto para que sucumbisse este tipo de programa barato, usurpador e psicologicmante criminoso contra as pessoas, a vida, a dignidade humana. Mas sei que este meu sonho está muito longe de ser realizado. Enquanto isto, espero que pelo menos a Globo tenha a dignidade de tirar fora este Pedro Bial, a cada dia meio fútil, meio babaca, vazio, bobinho como uma adolescente que acabou de chegar da fazenda. Meio viado, fazendo biquinhos e xanhas, que não ficam nem bem para um homem. Principalmente, naquela idade... Irritante do começo ao fim do programa. Por favor, vamos minimizar a bobagem. Babaquice tem limite.


Antonio da Costa Neto

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

...E O QUE É O ESPORTE NA ORDEM DAS COISAS?




Continuo fazendo as reflexões sobre a questão relativa à interferência do simbólico no concreto, segundo as definições e conceitos da moderna psicologia transpessoal, com a qual concordo integralmente. Minha concepção é a de que os grandes problemas do mundo estão ligados ao muito pouco entendimento deste aspecto por parte das pessoas, deixando um espaço imenso para que o poder, a política, os detentores do capital, o Estado opressor, a educação, enfim, as organizações iníquas da sociedade as oprima e as explore tão facilmente ao longo dos milênios que constituem a história das civilizações.
Hoje, de forma particular, gostaria de falar um pouco sobre o esporte, este monstro sagrado que arrasta multidões, que provoca delírios, encantos, e, ultimamente, sangue, morte, violência e crime. Qual seria o papel de tamanha importância que o esporte exerce sobre as pessoas? Que sentido tem, do ponto de vista político e social? Por que o governo, as organizações mundiais dos desportos – especialmente do futebol – fazem o maior empenho, gastam, investem tanto? Só para verem as pessoas felizes, pulando como macaquitos desgovernados, tontos e se refastelando de prazer nas arquibancadas dos estádios, dos autódromos, das quadras, das pistas? Por que se faz do atleta bem-sucedido um autêntico rei, com uma renda bilionária e capacidade de adquirir mansões cinematográficas, fazer viagens fabulosas ao redor do mundo e ganhar títulos e honrarias de verdadeiras celebridades intocáveis? Teria o esporte esta importância toda se as pessoas fossem suficientemente assistidas, educadas, satisfeitas com a vida que levam? Suspeito que não. Mas ao contrário, ele também é utilizado para esconder a miséria humana, para trapacear as pessoas, para enganá-las no jogo competitivo da vida?
Enfim, gostaria de responder a estas e outras perguntas afins, sempre buscando o olhar crítico, o pensamento dual - que existe em todas as coisas - para que enxerguemos o inegável “lado bom” do esporte e demais atividades físicas; mas percebendo com nitidez a sua grande perversidade, os desserviços ideológicos, humanos e sociais que prestam e que, na maioria das vezes não nos é permitido dar conta deles., tornando-nos inocentes úteis e manipuláveis por meio de recursos e estratégias que eu diria, cruéis e desumanas, mas que sabiamente, são acobertadas pela comoção das galeras, o encanto das multidões, a alegria de ver o seu time ganhar, o seu País ser o vencedor. O olé, o gol, o ponto, o chegar primeiro; embora possa estar faltando em nossas casas o alimento, o emprego, o remédio, o vestuário, as condições para uma vida digna em todos os seus aspectos, o que é o mínimo que nós, cidadãos comuns deveríamos ter e exigir.
Mas voltando à interação do simbólico com o real, o esporte nos faz calar a boca. O conjunto das humilhações que sofremos com um salário indigno, por exemplo, ou pior que isso, com o desemprego, o turbilhão do transporte de massa, a carestia do aluguél, o desrespeito dos patrões e dos chefes no trabalho, as endemias, a miséria, a violência, são facilmente descarregados e esquecidos quando podemos xingar o juiz da partida de futebol; extravasar nossas mágoas, estilhaçar nossos demônios internos, confraternizando a vitória que julgamos ser nossa, mas que não muda em nada as nossas vidas; apenas nos instrumentaliza para aguentarmos mais e termos onde descarregar.
Quando soltamos nosso grito primal de dor que se transforma num gol de placa, e ainda, marcado por aquele meu ídolo cheio de dinheiro e de status, e, como ele representa o meu país, eu me sinto um pouco na sua pele e me alegro com suas alegrias, me sinto também dono da sua fortuna, do seu patrimônio. E tenho mil delírios em acompanhar pela televisão a viagem de férias que ele faz, os hotéis luxuosos por onde se hospeda e assim por diante. Nosso ego se gratifica diante desta simbologia toda e, a partir daí nos sentimos inteiros, completos e felizes mesmo sem ter nada disso. Mas o cérebro humano aceita aquela mensagem como se fosse real. Aí, ficamos felizinhos, doces, descarregados, manipuláveis. Voltamos a trabalhar e produzir, a pagar o aluguél caro, o imposto injusto, a ser explorados e consumidos, sonhando com a próxima partida, o gol, a reportagem na televisão onde nosso ego nos eleva a nova celebridade, ainda que simbólica e pronto.
Isso sem contar a exarcebada violência ora concreta, ora simbólica do ganhar a qualquer custo, selecionando os mais capazes e dando a eles a honraria de vencedores. E o quanto mais chutes, mais gritos, urros, socos; melhor. Paramos o mundo para aplaudir os machos na copa do mundo ou as glórias das olimpíadas, enquando sociedades inteiras padessem de fome, de doenças, do desconforto, das secas ou enchentes, da guerra e de todos os males.
Assim a vida se torna fácil para os exploradores do povo, para os políticos pouco responsáveis, os empresários altamente competitivos. Fazendo transparecer como normal, justo e legítmo o acúmulo do capital, a concentração da riqueza, a socialização da miséria. Precisamos enxergar com mais sabedoria a ideologia do esporte, da escola, da igreja, das empresas, enfim, da sociedade moderna como um todo, para tirarmos conclusões que possam nos beneficiar, orientando-nos para caminhos mais gratificantes, construindo por fim, um Brasil melhor e mais justo, que, inclusive os grandes atletas pensam e dizem que estão ajudando a construir. Coitados, mal sabem que estão ajudando a piorar as coisas, melhorando-as para eles próprios e para as elites que eles tão bem representam.
No esporte, assim como na moderna sociedade, quem executa a regra, a norma não a ajuda a construir. Elas já vêm prontas e dfinidas nos manuais técnicos. Então, para que eu seja um jogador competente eu tenho que cumprir as regras que me foram impostas. Aí temos a figura do árbitro que policia a sua execução. E o comportamento fora da regra não muda o esporte, mas exclui o indivíduo do jogo, da partida, da maratona, enfim, da prática desportiva em si. E simbolicamente, isto é uma profunda lição de ditadura, onde quem tem poder cria a regra – para garantir os direitos e interesses próprios – e a impõe ao povo que terá de cumprí-la para ser aceito naquela dada realidade social, ou será excluído dela, expulso, preso, demitido, o que, no mundo de hoje é muito mais que um crime. E o esporte passa esta lição como se fosse a coisa mais natural do mundo.
No esporte, para ser feliz o indivíduo tem que se conformar. Nele o conformista é feliz, pois a não-conformidade consiste em arbítrio, em falta, em expulsão, o que a platéia em peso aplaude e se descarrega psicologicamente, mal sabendo que coloca em suas costas naquele momento uma imensa carga política, humana e social. Carga esta que transporta com muito sacrifício e que, no final das contas é usada contra si mesma, ou seja, contra o povo, a massa de trabalhadores, as classes populares.
Não quero aqui fazer a apologia do anti-esporte, pois sei do seu papel e da importância dele para a saúde, o bem-estar, a alegria das pessoas, mas espero que ele seja usado só para isto, e não, como subterfúgio pleno e barato; enganador das pessoas, principalmente das mais humildes e sem mais informação; para que estas se mantenham aniquiladas à função crítica que devem exercer enquanto atores sociais.
O esporte não pode ser elevado à categoria de esconder a miséria humana, servindo como amortecedor das consciências. Que vivamos o esporte em sua intensidade, mas separando com sabedoria o mal do bem, a alienação política da alegria. Pois já estamos no mundo há alguns milênios, e, grandinhos que somos, não podemos mais nos deixar enganar pelo gosto doce do chocolate como a criança tola que cai tão facilmente na lábia de um sequestrador. Já passa um pouco da hora da humanidade acordar para a vida. E poder vivê-la com a abundância possível.
Afinal, do ponto de vista estritamente psicológico, o esporte nada mais é uma demonstração nazi-fascista e esquisofrênica de selvageria, de exploração e de horror, mas fantasiada de lúdico, de graça, de alegria. E nós ainda pagamos pra ver. Aplaudimos, nos curvamos, chegamos às lágrimas, nos vendemos, prestamos reverências. Pobres de nós. Ainda temos muito o que aprender nesta vida.

Antonio da Costa Neto







sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

POR QUE A HUMANIDADE RESISTTE A EVOLUIR?



Muito me intriga o atraso mental, de percepção dos fatos e fenômenos, da qualidade de vida da humanidade apesar do incomensurável avanço da tecnologia, da eletrônica, das inacreditáveis descobertas da ciência moderna. Enquanto satélites artificiais da mais alta precisão circulam pelo universo e o homem visita os mais profundos escombros do infinito, nós continuamos claudicantes, meio cegos à mercê da astuta competição, dos meios articuladores da perversidade humana, expostos à fome, à degradação, à desgraça, à miséria.
E me pergunto, por que o homem consegue resolver problemas tão complexos, enquanto outros, de uma simplicidade absoluta o engole e o devora a olhos vistos todos os dias, tais como a degradação da natureza, o conflito do trânsito urbano, a violência, o fracasso da educação, as endemias? Isso só para exemplificar. É que os comandos hegemônicos de todos os poderes são muitíssimo articulados e conseguem manipular ideologicamente todas as relações e fenômenos. Usam da igreja, dos mitos, da bondade humana para manter as massas, os trabalhadores, o povo, alijados por anos, séculos, sem que percebam a realidade macro e se deixem facilmente, sucumbirem por ela.
Continuamos aflitos e perdidos em meio a tamanhos sofrimentos, opressões e maldades, quando, no longo período de existência e evolução da humanidade já poderíamos ter conquistado a paz verdadeira, a alegria de viver, a cura para nossos males, vislumbrando sonhos, melhorias e felicidades.
A meu ver, isto se deve a duas variáveis muito importantes: a extrema e doentia competição que faz parte do contexto vivencial dos mamíferos, dos animais de sangue quente, dos quais o astuto “bicho homem” faz parte, e, por outro lado, a alienação das pessoas. Há um esforço muito grande em todos os segmentos da sociedade, orientados pela própria competição, de fazer tudo para que o outro se dê mal, que fique subordinado, dependente e que possa sempre obedecer aos ditames de quem se coloca na frente, no poder, no mando.
Assim, o jogo psicológico é da mais extrema importância. O condicionamento que se opera no inconsciente das pessoas e que orienta o seu consciente – que por sua vez se registra no subconsciente é absolutamente fundamental, conforme as teorias do velho Freud, que, é claro, não podem mais ser consideradas isoladamente, mas que fazem parte do arcabouço histórico, conceitual e prático das ciências psicológicas e que não podem ser abandonadas. Os profissionais da psicologia deveriam fazer todo o esforço possível e até impossível para tornar pública esta realidade. E não o fazem, justamente porque seria fortificar a consciência, a crítica, a posição argumentativa do povo que passaria a reivindicar seus direitos, a incomodar o sonolento “status quo”, e por isso mesmo, não é permitido que seja feito.
Fico escandalizado com a falta de desdobramento, da visão unilateral das massas incautas, inocentes úteis ao jugo do poder que só consegue enxergar o lado bom das coisas. Onde será que foi parar a dialética de Aristóteles? Pois as pessoas não têm, no mínimo, um pensamento dual. Acham que o esporte é bom para o corpo, o entretenimento e pronto. Pensam que as escolas ensinam, formam e ajudam a constituir a cidadania, os direitos humanos. Ainda acreditam no teor relaxante e onírico do carnaval e na possível bondade exposta na bíblia sagrada e nos demais instrumentos de coerção religiosa como o alcorão, o livro dos espíritos e muitos mais. Claro que estes fenômenos existem, mas não só, se fazem acompanhar do lado perverso, monstruoso, horrível que ninguém enxerga.
Pensem comigo. Quando rezamos: ..."Pai Nosso que estás nos céus, santificado seja o Vosso nome, seja feita a Vossa vontade..." não estaria o nosso inconsciente abençoando e aceitando os palácios dos governantes, as mansões dos patrões, a definição unilateral por eles de normas, limites e dogmas que apenas os beneficiam? Quando pulamos como macaquitos nas arquibancadas dos estádios, não estamos dando vazão aos direitos que não temos, à comida que nos falta, à precariedade da saúde pública, à falta de habitação, de lazer, de dignidade?
Por que sempre nas novelas da TV Globo o moço bonito, rico, branco, de olhos verdes se casa com a mocinha ingênua e doce, herdando mansões e indústrias que os deixarão felizes – não só até que a morte os separe mas – para sempre? E o carnaval que nos enche de glamour, de poderes mágicos, nos transformando em reis e príncipes por alguns minutos que compensam a fome, a miséria, as enchentes a violência urbana o ano inteiro?
E as escolas que impõem horários, uniformes, conhecimentos, professores, locais, tratando-nos como se fôssemos meros objetos, ferramentas para o lucro futuro do capital internacional e que somos obrigados por lei a freqüentar, a dizer sim, a cumprir todos dos seus muitos rigores e exigências? Quando crianças, vamos para elas para que lavem nossos cérebros e depois de adultos, fazemos todos os esforços, gastamos nossas economias para que elas desgracem nossos filhos e nunca, nem de longe desconfiamos disso.
E as igrejas, seus incrementos, rituais, seu modo incoerente de apregoar a justiça e a caridade como se ambas sinônimos fossem? Os estatutos das empresas, das organizações? E a burocracia inútil que se desdobra anos a fio nos palácios da administração pública fria, linear e cética, buscando a qualquer custo o bem-estar dos poderosos, os lautos banquetes, os iates, as festas, a bebedeira, a luxúria, a farra?
Enquanto isto a pobre humanidade busca apalpando no escuro os caminhos para sobreviver ao caos histórico que assola a sua existência sem objetivos maiores, já que repete há milênios os mesmos ciclos viciosos. Tão cega e fraca, coitada, que ainda acusa de tudo isto e muito mais, justamente aquele que não o é. Que luta e se esforça sempre para que ela, enquanto criança tola, não volte a cair no mesmo abismo, reabrindo suas feridas que poderão não mais cicatrizar de tão reabertas.
Temos mesmo de quebrar os paradigmas, revolucionar as ciências, reconduzir os valores e dogmas que constituem a vida. A ordem é analisar, questionar, desdobrar tudo. Enxergar a dualidade das coisas. Entender que nada é totalmente bom e que, por vezes, o lado ruim, o cruel, o maligno das coisas pode ser um iceberg milhares de vezes maior do que a superfície encantadora que se encontra na superfície e por cima das águas profundas. Havemos de questionar com profundidade, tudo e buscar a imediata correção das falhas e defasagens historicamente acumuladas nos fenômenos humanos e sociais, desde que eles existem e que, tão sabiamente conseguiram esconder suas monstruosidades por vezes, tamanhas. Pelo menos que a humanidade pare de competir com o que deveria cooperar e cooperar com com o queveria competir. Este é o recomeço possível para a condução da vida no planeta.


Antonio da Costa Neto

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

INTERNET X ESCOLA: A SINTOMATOLOGIA DO ATRASO



Quase todas as transformações tecnológicas geram revoluções humanas e sociais em suas áreas correlatas. Por exemplo, não temos mais as famosas tinturarias, as serpentinas de cano que esquentavam a água nos fogões à lenha. Os correios quase não entregam mais cartas e correspondências, mas tiveram de inventar outras atividades para que pudessem sobreviver enquanto empresa. Assim acontece no mundo do marketing, dos fest-foods, do esporte, do lazer, das comunicações, do transporte. Enfim, tudo muda, se transforma, se atualiza com o advento da tecnologia moderna, com as novas e sofisticadas invenções que facilitam a vida, agregam mais conforto, diminuem gastos e custos, aceleram movimentos, reduzem distâncias, etc. Só a velha escola é que continua a mesma, desde muito antes de nossos tetra-avós, devendo, pelo modo como vemos, continuar assim ainda por gerações a fio. Ela é uma organização intransigente, velha, cascosa, grossa, antiga mesmo. Resiste com todas as forças a quaisquer formas de mudança.
Tais como as conhecemos, as escolas aí estão há um sem número de séculos de história da dita evolução da humanidade. Elas dão aulas. Meramente instruem. Reproduzem os conhecimentos. Antes, mimeografavam, hoje, xerocam os textos prontos, repassam as informações sem averiguá-las, questioná-las, analisar seu contexto, sua importância e sua finalidade nem mesmo técnica, quanto mais a humana e social.
Chegamos há um tempo em que a Internet realiza com muito mais eficiência e dinamicidade aquilo que as escolas fazem de forma lenta, monótona, atrasada e muito desinteressante. Faltam às escolas o que a tecnologia tem de sobra: recursos, versatilidade, criatividade, ousadia, suspense, processos e resultados fabulosos e imediatos.
Brincando outro dia no meu computador, encontrei um sem número de sites que ensinam passo as passo desde operações matemáticas mais simples, até sofisticadas equações de física, de álgebra, trigonometria, cálculos dos convencionais aos mais modernos, complexos e sofisticados. E usam para isso cores, estilos diferenciados, movimentos, círculos, setas que mudam de tamanho, que rodam, mudam de sentido, de forma, prendem a atenção de forma lúdica e motivadora, tão diferente e superior à maioria de nossas aulas tão cansativas e mórbidas. Sons que vibram, que repetem barulhos da natureza, que emitem músicas, induzem ao silêncio, à reflexão; uma maravilha.
Sites, blogs, bibliotecas virtuais, exposições on-line, teleconferências e infinitas inovações que ensinam de forma sofisticada todos os conhecimentos das ditas ciências físicas, práticas, mecânicas, biológicas, humanas, exatas. De forma que a escolas que temos e que meramente instruem, repassam, realinham o conhecimento pronto estão definitivamente superadas na ordem das coisas, no processo de evolução histórica da humanidade. E o que quer que as escolas façam neste sentido, o de meramente instruir, induzir, fazer decorar os conhecimentos prontos, a internet é capaz de fazer melhor, mais rápido, com uma mínima margem de erros e com uma estrondosa capacidade de resultados.
Da forma que foram concebidas e que até hoje aí estão, as escolas ocupam um espaço que não é mais delas, mas da Internet, dos computadores, da alta tecnologia, atualmente, em grande acesso, muitas vezes a preços populares, em ambientes públicos, em locais terceirizados, em casa e altamente utilizadas para tais fins.
De forma que encontramos numa bifurcação histórica frente aos processos de evolução do conhecimento. De um lado, podemos tranqüilamente sugerir que o governo transforme as escolas em grandes casas de computação (Lan House), onde o aprendiz recebesse a orientação mínima que poderia ser dada pelo próprio computador. E ali faria seus estudos com muito mais rapidez, eficiência de processo, resultado, motivação e interesse.
Pois é muito melhor estar no computador, onde a criança, o adolescente, o jovem, ou mesmo o adulto passa horas seguidas sem pestanejar; do que assistir a aulas enfadonhas, sem interesse, mal-dadas, mal-pagas e mal-preparadas para que justamente, ninguém aprenda nada. Depois, ele poderia escolher a seqüência, o assunto, o método, a lógica que mais o interessasse. Depois, de período em período, ele faria, digamos, uma prova para o MEC, pela própria Internet e assim que estivesse pronto, seria certificado do seu nível de conhecimento, com que prosseguiria seus estudos.
Isto sem falar que muitos estudariam em casa, a custo zero para o governo. Seria muito bom em todos os aspectos. Quanto aos professores e pessoal da escola, uma vez justificada a sua absoluta falta de necessidade profissional teria, por exemplo o mesmo destino dos trocadores de ônibus que foram gradativamente substituídos pelas catracas que não adoecem, não se estressam, não tiram folga e tudo continua funcionando maravilhosamente bem. Pois função minimamente técnica como a que os educadores de uma maneira geral vêm exercendo, deve ser cumprida por máquina. É um desperdício e um descalabro sub-aproveitar gente para fazer isso, como vem acontecendo nas nossas escolas.
Talvez, desta forma, a escola continue sendo necessária nas séries iniciais, onde o aluno tem acesso aos número, às letras e aprende a ajuntá-los; a única coisa que ela tem feito e que de fato acrescenta algum valor, alguma sabedoria aos que aprendem, daí para a frente a tecnologia e a eletrônica têm dado mostra de uma muito maior eficiência e eficácia no campo do ensinar, do aprender e do instruir para reproduzir o conhecimento o que é muito pobre frente à complexidade das exigências do mundo.
Uma outra suposição possível, e, esta sim, comunga com os ideais da educação enquanto ciência e prática social contextualizada, seria a escola partir daí, de depois da Internet para fazer o indivíduo pensar, a analisar criticamente o teor do conhecimento que adquiriu. Facilitar a interação do saber com a interbujetividade do ser, tornando-o capaz de usar o seu saber contextualizando-o efetivamente à sua vida, realizar as conquistas de que necessita, contribuindo como agente social para melhorar o mundo para si, para os seus e para todos.
Para continuar existindo a escola e a educação formal precisam ir além dos limites da ideologia, da contestação política, se atrever, ousar, ser afetiva, personalista, intermitente, nova. Ensinando o indivíduo a ser livre, crítico, autônomo, sensível, afetivo, criador, agregando outros saberes que não os unicamente ditados pela perversidade do capitalismo caquético, centralizador e periférico que constitui nosso tormento e nossa agonia enquanto cidadãos, enquanto seres vivos. É preciso que elas passem a ensinar o amor, a afetividade, a compaixão, a harmonia, a ecologia, a beleza. Mas para que isto aconteça é preciso que os educadores em geral e os professores em particular aprendam primeiro estas lições. Pois a vasta maioria deles é cega neste sentido e está muito longe de saber disto.
O caos, as crises das escolas são sintomáticos e não casuais. Eles são um convite para que os educadores mudem suas práticas, repensem profundamente seus conceitos. Que agreguem qualidade ao que fazem que ensinem também a inventar e não somente o que foi inventado. Que construam com seus alunos a história das civilizações contemporâneas e não os obriguem a se conduzirem pelas mesmas trilhas de um passado que não mais deveria existir.
Mas tudo isto requer trabalho, leituras, mudanças. E, acima de tudo, deveremos abrir mãos de privilégios caducos, de poderes simbólicos e inexpressivos a que tanto nos apegamos pela nossa cultura competitiva, cega, linear e estagnada. Não temos mais que conscientizar os professores em geral e os educadores em particular. Precisamos acordá-los para que não sejam ceifados pela morte antes mesmo de abrirem seus olhos para vislumbrarem os horizontes de prosperidade, vida, sonhos e alegrias, que talvez, nunca virão. Pois a educação que temos jamais permitirá.

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(*)Professor, pesquisador e conferencista em educação. Autor dos livros: Paradigmas em educação no novo milênio; Escolas & Hospícios – ensaio sobre a educação e a construção da loucura (Ed. Kelps-Goiânia). Estando no prelo: Reflexões de Giovana – educação para a vida.

sábado, 2 de fevereiro de 2008

DINÂMICA DAS ESCOLAS: O REAL E O SIMBÓLICO FAVORECENDO A EXPLORAÇÃO DAS PESSOAS



Fala-se muito na crise mundial da educação e das escolas. Pais, professores, alunos, gestores escolares, comunidades em geral se mostram bastante insatisfeitos com os processos e resultados da educação formal das pessoas em todo o mundo. A crise passa pelas questões salariais, profissionais, e, principalmente, acadêmicas e pedagógicas, deixando todos os envolvidos perplexos, com as mãos na cabeça e se perguntando o que e como fazer.
Como estudioso da área eu diria que o problema da escola é a própria escola. Sua linha de ação duramente estereotipada por um modelo que já não funciona mais. Elas são lineares, cartesianas, reducionistas, duras; quando o mundo de hoje requer uma visão cíclica e evolutiva dos fatos e fenômenos. A saída do paradigma cartesiano dogmático, unilateral e disciplinar; adotando uma nova proposta mais flexível, aberta, crítica; diríamos, mais, no mínimo, politicamente correta. Infelizmente grande parte dos educadores foi eficiente treinada e cega para não enxergar as suas indiosincrasias, maldades, perversidades, desserviços. E como não eles não sabem – e o que é pior, na maioria das vezes nem querem saber disso – continuam cometendo estes pequenos crimes contra o ser humano, a vida, a dignidade, a cidadania, ajudando a construir o caos social sem precedentes em praticamente em todo o mundo, neste especial momento histórico em que nos encontramos.
A moderna psicologia da ciência, dentro da qual eu me considero inserido, revela-nos por meio de anos de pesquisas, a grande influência dos fatores psicológicos, das medidas do inconsciente na formação da personalidade das pessoas e na estruturação da conduta delas no mundo e na vida. Gerando aí a sociedade que temos, seus entraves, problemas, sofrimentos, alegrias, facilidades, dificuldades. Assim as escolas, com maestria, posicionam-se autoritariamente e, de certa forma, contra seus alunos que, por sua vez, constituem a sociedade, fazendo deles pobres, incautos, inocentes úteis alienados, a serviço de uma ordem mundial exploradora, desumana, cruel e ultrapassada.
Exemplificando, o grande problema do mundo de hoje, o pelo menos a causa principal dele é a astuta concentração do poder e da renda. É isto que gera a pobreza, a miséria, as favelas desestruturadas, o transtorno da violência urbana, a fome, o desemprego, a degradação da natureza, o desgoverno no trânsito e assim, por diante. Acredito que, até aqui, todos estamos de pleno acordo. Ora, a sociedade em peso, que por meio da escola passa por uma média de 5, 10, 15 ou mais anos de imposição do conhecimento centrado na cabeça, na linguagem e na vontade de um(a) único(a) professor(a) que induz, avalia, cobra, aprova, reprova, não estaria inconsciente e psicologicamente preparada para receber, aceitar e até apoiar a concentração do poder e da renda, exatamente como temos hoje em todas as dimensões do dito mundo civilizado?
E os processos contínuos de neutralização da vontade própria que se dá na medida em que se ouve todos os dias dos condutores da educação e da escola, por exemplo:

a) Você não pode vir com esta roupa. Pois “a diretora” estabeleceu que o uniforme é desta ou daquela forma e a partir de amanhã ninguém mais entra sem ele.
b) Agora não é hora para discutirmos este assunto, guarde isto para depois e preste atenção na aula de matemática.
c) Vamos seguir este livro que todos vocês vão ter que adquirir, pois “a equipe pedagógica” definiu que é este e pronto.
d) Não queremos saber que horário você prefere. Mas terá que freqüentar as aulas pela manhã e no horário rígido e sem tolerância das tantas às tantas horas.
e) Cadê o dever de casa? Se não fizer de novo, será punido severamente.
Enfim, nossas escolas funcionam a partir da matriz da imposição, do medo, da intolerância, do desamor, da brutalidade; formando cidadãos que para sempre, serão medrosos e subservientes, perpetuando os interesses do comando hegemônico da sociedade. E, com ele, a frieza, a obstinada ganância com as quais perpetuamos as desgraças e as profundas dores do mundo, embora já estejamos em pleno terceiro milênio de evolução da vida, da história e dos destinos do homem no mundo, sem contar, claro os não poucos períodos que antecederam a era cristã.
É preciso que os educadores saibam disso. E mais ainda, que se revoltem contra este jogo medíocre e ridículo que fazem deles carrascos de si próprios. As mudanças precisam ser feitas, ainda que de forma gradual. Os alunos precisam e devem ser ouvidos quanto às questões crucias a que vão posteriormente obedecer. Precisam ser tratados com amor, carinho, fraternidade, reconhecimento, respeito. Estarem conscientes de sua escolha e do seu desejo. Pois simbólica e psicologicamente quem é o diretor, ou mesmo o professor para, de forma determinante “enfiar” garganta a baixo conhecimentos, horários, uniformes, regras, normas, imposições e limites? Agindo assim, estamos construindo uma sociedade de alheios aos seus direitos, de indivíduos facilmente exploráveis, de marionetes a serviço dos interesses dos comandos e só.
Já passamos muito da era do gerenciamento unicista, machista e centralizador em que manda quem pode e obedece quem tem juízo. Quem, hoje, obedece sem participar do processo, se revolta, adoece, mata, morre, seqüestra, violenta ou se nega a participar. A ótica da educação está intimamente vinculada a este processo, sendo a grande responsável por “fazer a cabeça das pessoas” e com isto, construir a história da vida, o mundo que temos e nossas cada vez mais reduzidas esperanças de melhores dias e capacidade de sonhar com novos e floridos horizontes para todos.
Afinal, para que servem a ciência, a escola, a educação e o aprendizado disto tudo se a vida não se transforma para melhor em qualidade e quantidade? Se o mundo vai mal, como o nosso, absolutamente tudo precisa ser repensado. O que começa com a escola a maior responsável em aprender e nos ensinar a fazer tudo isto.

Antonio da Costa Neto